ORÇAMENTO DE 2011
Declaração de voto
Antes de mais, deve considerar-se que o orçamento é o documento de gestão mais importante do município e devia ser tratado, preparado e analisado de uma forma correcta, ponderada e profunda.
Mais uma vez tudo aponta para se pretender descredibilizar cada vez mais este documento, não havendo da parte dos responsáveis o cuidado e o rigor que a sua importância justifica.
Houve atrasos na sua disponibilização aos vereadores bem como alterações de última hora num documento da maior importância, o que não é aceitável.
Depois a própria apresentação do documento deixa muito a desejar, revelando a falta de cuidado e displicência com que o mesmo é tratado.
De salientar que a própria memória descritiva do documento apenas nos foi disponibilizado ontem à tarde, pelo que logo por aqui se pode avaliar a importância que é atribuída ao documento e o respeito que é destinado aos vereadores.
Embora a memória descritiva do orçamento não seja objecto de votação, ela é bastante importante pois deve completar a informação contabilística do orçamento, esclarecendo alguns aspectos e prestando informações sobre algumas rubricas orçamentais ou definindo prioridades de intervenção, timings de execução, estratégias a adoptar e objectivos a atingir.
Depois também não existem motivos justificativos para que cheguemos a esta altura do ano e ande toda a gente a preparar o documento à pressa para se conseguir votar o orçamento em tempo útil e para que a Assembleia também o faça.
Mas este é o aspecto formal do assunto que é importante mas que não é o mais importante.
Com efeito, o fundamental é avaliar se o orçamento é realista e rigoroso. Isto é, se o orçamento se baseia em premissas concretas, em resultados anteriores, em realidades palpáveis, para se avaliar se as previsões que contempla são aceitáveis. Porque o orçamento é o documento de gestão da Câmara que norteia a sua actividade, sendo certo que a autarquia é avaliada no final de cada ano pelo grau de cumprimento dos parâmetros que ela própria estabeleceu.
Porque das duas uma: ou o orçamento está elaborado com o mínimo de rigor e é aceitável, ou então não está e não é aceitável. Este é o princípio básico que deve orientar quem o elabora e conduzir o raciocínio de quem o analisa.
Atendendo a estes aspectos, não será exagero dizer que este é o pior orçamento da Câmara Municipal de Torres Novas nestes últimos anos.
Com efeito, está elaborado sem rigor, não tendo em consideração a situação concreta do concelho a nível da sua realidade inquestionável, criando a ilusão de ser possível arrecadar as receitas previstas, criando verbas puramente imaginárias, fora da realidade e ao arrepio dos níveis de execução orçamental do ano anterior.
Todos nós sabemos que os anteriores orçamentos também padeciam destes vícios, tendo sido inclusivamente estas situações de irrealismo e de défice de execução orçamental apontados na conta de gerência de 2009 pelo revisor e pelo próprio Tribunal de Contas relativamente a 2007, como fiz questão de assinalar na minha declaração de voto relativa ao orçamento de 2010.
No entanto, para além dos mesmos vícios este orçamento ainda acrescenta outro: esquece-se de que estamos a viver uma crise muito grave, a qual se vai agravar ainda mais no próximo ano. Deste modo, as receitas do IMI, IMT, taxas, multas e outras penalidades, loteamentos e obras irão decair ainda mais do que o que aconteceu durante este ano. E pela simples constatação desse aspecto tais receitas deveria baixar substancialmente, mas isso não acontece. Aliás, o que acontece é o contrário, ao arrepio de toda a lógica.
A este respeito veja-se que embora e de forma ilusória a dotação global do orçamento tenha um valor mais baixo que o de 2010 pois passou de 71.660.984 € para 69.143.983 €, baixando assim cerca de 2,500 milhões de €, este valor continua exageradamente empolado se verificarmos que no ano transacto apenas foram executados 37,2% do orçamentado. Com efeito, a execução orçamental ao nível da arrecadação de receitas ficou-se pelos 26.675.053 €. Portanto pode afirmar-se sem grandes receios de exagero que a dotação orçamental está empolada em cerca de 42 milhões de euros.
Vejamos, quanto a estes aspectos, as receitas correntes.
Para este ano está prevista uma receita de 33.533.417€ o que se trata de um aumento de cerca de 3% no que foi orçamentado para o ano passado. Mas em 2010, desse valor, apenas se receberam 20.231.459€o que constitui apenas 62,5% do previsto. Como para o ano de 2011 o valor orçamentado ainda aumentou mais de 1 milhão de € então verifica-se que estão cerca de 13 milhões de euros a mais.
E quanto a este respeito o panorama dos impostos directos não é mais animador, antes pelo contrário. Como se sabe, os impostos directos são constituídos essencialmente pelo IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) e pelo IMT (Imposto Municipal sobre Transmissões). Como previsão corrigida de receita ao nível dos impostos directos constava para 2010 o valor de 6.626.950€ mas apenas se arrecadaram 4.975.810€, com a agravante de que a previsão inicial era de 8,677 milhões. Agora prevê-se arrecadar a quantia de 6.862.371€ sendo este um valor ainda superior ao do ano passado.
No que respeita ao IMI o valor previsto se mantém muito próximo do arrecado, mas devia ser mais reduzido em face da crise económica.
Mas esta disparidade é ainda mais evidente no que respeita ao IMT porquanto no próximo ano este valor deverá baixar ainda mais do que já baixou este ano. Com efeito a verba prevista de 2,717 milhões não é realista uma vez que apenas se recebeu em 2010 pouco mais de 1 milhão de euros.
Quanto aos impostos indirectos a situação ainda é pior. Se em 2010 a previsão foi de 6,564 milhões mas apenas foram recebidos 915.649€, constituindo apenas 12,9% de execução, então para 2011 a diferença ainda é maior porque a previsão ainda subiu mais de 1,300 milhões, para 3.723.168€ o que constitui um aumento de 765% sobre o valor executado em 2010.
Nos impostos indirectos assumem especial relevância os loteamentos e obras com um valor de 6,007 milhões quando se previu a mesma verba em 2010 mas apenas se receberam 516 mil €, o que constitui apenas 8,6% de execução.
Aliás, pelos vistos pretende-se equilibrar o orçamento à custa destas verbas absolutamente irrealistas dos loteamentos e obras que, naturalmente e pelas razões de retracção económica de todos conhecidas, irão baixar ainda mais no próximo ano. Mas no orçamento parece que se acredita num milagre.
Nas taxas, multas e outras penalidades estão previstos 3.723.168€, mas em 2010 estava um valor corrigido de 3,425 milhões quando no final do ano apenas se recebem pouco mais de 433 mil €. Isto significa que o nível de execução foi de apenas 12,6%. Portanto, só por estes exemplos, dá para perceber a enorme diferença que existe entre a realidade e a previsão.
Mas o panorama é ainda mais grave nos loteamentos e obras que têm uma previsão de 3,220 milhões que precisamente igual à previsão corrigida de 2010, mas o problema é que em 2010 apenas se arrecadaram 9,18% desse valor, ou seja 293 mil €. E portanto o nível de execução vai baixar ainda mais.
Mas se este é o panorama relativamente às receitas correntes, a situação das receitas de capital ainda é pior.
Com efeito, as receitas de capital são no total 35.607.065€, mas em 2010 apenas se arrecadaram 5.933.779€ pelo que a verba orçamentada contém cerca de 30 milhões de euros a mais.
Na rubrica venda de bens de investimento estavam em 2010 previstos 22.250.875€ mas apenas se receberam 42.576€, o que significa apenas 0,2% do previsto, nível de execução verdadeiramente impensável. Mas se o valor previsto para 2010 já era um valor inimaginável, então o valor para 2011 é escandaloso. Com efeito, para 2011 estão orçamentados 23.555.808 o que significa um aumento de 1,300 mil € sobre o valor orçamentado no ano transacto. Só nesta rubrica estão cerca de 2,500 euros a mais.
Da venda de bens de investimento faz parte a famigerada rubrica venda de terrenos, que é um caso paradigmático do irrealismo e falta de rigor deste orçamento. Mais uma vez nesta rubrica se verifica um exageradíssimo empolamento das receitas. Com efeito, o valor de 17,929 € previsto no orçamento para 2011 é ainda superior ao valor corrigido constante no orçamento de 2010 que era de 16,894€. Mas desta previsão apenas se receberam 32.246€ ou seja 0,19% do previsto. Ora, se da verba orçamentada no ano passado quase nada se arrecadou então o que dizer da verba orçamentada para o próximo ano? Há algum realismo ou rigor nesta matéria? A resposta é evidente.
Quanto às grandes opções do plano, devemos ter em consideração que a Câmara é sempre responsável pelo pagamento de uma parte dos custos das obras com apoios comunitários.
E por isso, a sua situação financeira deve ser devidamente acautelada para que a dívida não atinja valores incomportáveis e para que o esforço do seu pagamento não seja relegado de forma irresponsável para os vindouros.
Não podemos dar passos maiores do que a perna, devendo adequar os projectos e as opções de investimento à nossa realidade municipal e às nossas dificuldades financeiras.
Não se vislumbram no orçamento medidas concretas e planeadas de redução de despesas municipais infrutíferas nem de definição de prioridades quanto aos investimentos, sendo certo que uma correcta gestão municipal implicaria tomar opções de forma ponderada e adequada ás nossas actuais dificuldades.
Por tudo isto, voto contra este orçamento.
Carlos Tomé, vereador da CDU
15.12.10